Felix Da Housecat, o diabo digital!

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Figura inconfundível da cena electrónica, Felix Da Housecat, mudou-lhe o curso quando em 2001 “Kittenz And Thee Glitz” chegou e revolucionou as pistas de dança que depressa se converteram ao electroclash. Temas como “Silver Screen Shower Scene” e “Madame Hollywood”, com Miss Kit- tin a emprestar os seus dotes vocais, ficaram na memória colectiva. Três anos depois saí “Devin Dazzle And The Neon Fever”, e Felix muda totalmente de rumo e, talvez por isso, o êxito de “Kittenz…” não se repetiria. “Virgo Blaktro & The Movie Disco” é o seu novíssimo álbum e, apesar de assistir ao regresso de Felix à electrónica na linha do seu primeiro álbum, explora outras sonori- dades.Falámos ao telefone com FelixDaHousecat a partir de Chicago.

“Virgo Blaktro & The Movie Disco” é o teu terceiro álbum de originais como Felix Da Housecat. Com o primeiro, o brilhante “Kittenz & Thee Glitz”, caste eternamente ligado ao início do revivalismo electro a que se chamou elec- troclash. No segundo álbum decidiste mudar totalmente de direcção musical e acabou por passar muito mais des- percebido que o registo de estreia. Com este novo disco seguiste que direcção? As pistas deixadas por “Kitten…” ou a revolução pós-punk de “Devin Dazzle And The Neon Fever”?

Este álbum é o meu preferido dos três. O meu pai disse-me que eu tinha que fazer um disco negro, algo que honrasse as minhas raízes e eu decidi chamar-me Virgo Blaktro, porque nos anos setenta era corrente usar referências à astrologia e eu sou Virgem, e o Blaktro é óbvio. Os Movie Disco são a minha crew. Queria fazer electrónica mais funky, mais negra, e menos europeia. Foi um grande desa o para mim e há quem diga que não soa a música negra. Este disco demora a ser absorvido, ao contrário do “Kittenz…” que foi imediato porque era uma brisa de ar fresco face ao house e ao techno que eram mainstream na altura. O “De- vin Dazzle…” não saiu tão bem como eu queria porque havia demasiada pressão sobre mim para editar um novo álbum depois do “Kittenz…” e eu queria ir numa direcção totalmente diferente. Para este disco decidi que ninguém me ia pressionar, fui para Barcelona gravá-lo e divertir-me sem pressões de qualquer espécie. A diferença é audível!

Um dos temas deste novo álbum, o “Moviedisco”, aventura-se por territórios nu disco…
Esse tema era para ser um instrumental e foi o primeiro som que z para o disco, chamava-se “Keyboard 22”. Depois mudei o título porque ouvi uma música dos Daft Punk e quei com uma ideia musical na cabeça, e pôr-lhe vocais. Este é o primeiro álbum que faço em que cada tema tem sempre ou um vocal, ou um hook ou um chorus. Foi algo que saiu naturalmente assim. Quis tocar sintetizador, e fazer algo que soasse a Giorgio Moroder ou a John Carpenter, que são dois dos meus heróis. É estranho porque para alguns temas vais para o estúdio já a saber o que queres fazer e outras sentas-te simplesmente em frente às máquinas e cas a vê-las nascer. Para o “Moviedisco” tinha uma ideia mas depois ouvi os Daft Punk e nasceu outra ideia a partir dali que não tinha muito a ver com o tema deles. É interessante o processo da inspiração. Inspiramo-nos uns aos outros.

Desculpa, tenho o telemóvel a tocar. Acontece sempre isto a meio das entrevistas, da última vez estava a entrevistar os Di- gitalism, o telefone tocou, e eles desataram-se a rir e a gritar em coro: “Olá, mãe!”.
(Risos) Eu tive que desligar o computador porque estava toda a gen- te a mandar-me mensagens no AIM. Vou-te contar uma história en- graçada a propósito dos Digitalism. Fui tocar a um festival na Irlanda onde tocavam os Digitalism e os Justice, quando voltei para o hotel fui para o quarto dos 2 Many DJs e levei-os para o bar, eles foram buscar o gajo baixinho dos Justice, e fomos todos para o bar do hotel. Os Digitalism também estavam no bar do hotel e eu virei-me para o gajo dos Justice e disse-lhe “Gosto imenso do vosso trabalho e vou passar a chamar Digi a um de vocês e Lism ao outro!”, claro que eu já estava bêbado, e vem o David dos 2 Many DJs e diz-me “Felix! Este é dos Justice!”. Claro que me des z em desculpas e desatei a cantar o “D.A.N.C.E.” para ver se me safava! (risos) Devo ter cantado aquilo vinte e cinco vezes. Era a primeira vez que os encontrava e eles devem ter pensado que eu era um americano estúpido e vulgar! Claro que o David e eu morremos a rir com aquilo. Eu sabia que eram os Justice mas estava a chamar-lhes Digitalism. Conheci os Digi- talism em Hamburgo e eles dizem que já me conheciam há muito tempo mas eu não me recordo. É normal, eu sou um velhote nestas andanças… (risos)

Este álbum tem dezasseis temas com durações completa- mente diferentes, mesmo compreendendo o sentido do interlúdio aqui tens temas longos com mais de seis minutos e temas com trinta segundos…
Eu queria que o “I Saw The Future” tivesse um segundo e o pessoal da editora não deixou! Os meus interlúdios são produzidos como mú- sicas completas mas depois encurto-os porque acho que lhes falta qualquer coisa, por isso são mini-temas, o resultado é um mini-musi- cal! O “Blaktroman” era um tema com uma duração normal mas não me soava bem no resto do disco, a única coisa que me soava bem era o chorus. Por isso transformei o chorus num interlúdio. Com o “Mad Sista” aconteceu algo semelhante. Se tenho boas ideias musicais elas acabam no disco, mesmo que sejam sob a forma de interlúdios. Hoje, ao falar com o meu irmão, ele perguntou-me porque é que o “I Seem 2Be The1” era tão curto porque é o tema preferido dele. É também um dos meus temas preferidos por isso vou voltar para o estúdio e fazer uma versão longa.

Não é preocupante… isto é música electrónica, podes fazer novas versões, remisturas, o que te apetecer, o caminho está sempre aberto…
Podes crer! Ainda bem que não faço hip hop ou R&B porque com a electrónica podes sempre fazer o que te apetecer, no hip hop e no R&B é sempre a mesma fórmula.

Que software usaste para produzir este álbum?
Eu era um tipo do Pro-Tools mas neste disco usei o Logic. Gravei os sintetizadores para o Pro-Tools e depois passei-os para o Logic. O computador, esse diabo digital! Os anjos analógicos versus o diabo digital (risos).

E ainda tocas vinil ou já te converteste ao diabo digital?
Passei do vinil para os Cds, depois passava a vida a riscar os Cds e a dá-los, agora é só Serato, o diabo digital! (risos) É tão mais fácil e podes visualizar tudo.

Tu vens frequentemente ao nosso país e és sempre bem rece- bido, as pessoas gostam do teu trabalho e de te ver tocar…
Eu adoro Portugal! O pessoal é um bocado maluco. Da última vez toquei no Buddha de Lisboa e foi uma festa brava! Comecei calminho mas às tantas decidi mudar tudo e tocar bem forte, foi óptimo.

Texto: Sónia Silvestre

in  Dance Club #124 (Set.2007)

By Sónia Silvestre