Do horizonte vê-se a esplanada do Nautk, um restaurante bar que passa despercebido entre o mar e outras distrações ao longo da marginal; mas que é na verdade um diamante humilde em bruto. Porquê? A resposta é simples: música. Numa tarde “sextafeirenta” agradável (para aqueles que gostam de vento) tive a oportunidade de desfrutar de um pôr-do-sol memorável afinado pelo set de house que o Tanguy Delforge passou. O alvo do dia, uma personagem multi-facetada que trouxe ao bar de São Pedro uma nova vida não só pela sua visão empresarial mas também pela sua criatividade palpável. Um belga, que fala português do Brasil – sim existem – por lá ter vivido uns anos antes de vir para Portugal, veio cá parar com os estudos como acontece muito por aí.
Vim para cá para estudar, vim fazer um mestrado. Quando terminei pensei em voltar para a Bélgica, dado que já tinha a minha empresa de eventos chamada Utopia. Mas entretanto conheci o dono desde bar panorâmico e encontrei aqui uma oportunidade de fazer a diferença, já que não havia ninguém a tratar de eventos ou a fazer promoção nas redes sociais ou marketing. Percebi que podia ter um papel ou criar um trabalho e resolvi abordá-lo e passei a fazer parte da equipa.
Então para além de DJing a tua paixão é produzir eventos?
Sim completamente. Foi como tudo começou na verdade. Já tinha a minha empresa há dois anos, dois anos e meio; eu não era DJ antes, o meu irmão é que era e depois ensinou-me a ser DJ. Então percebi, mais vale tocar nos meus eventos não é? E basicamente foi assim.
A junção da música, do petisco e do ambiente agradável criam uma simbiose perfeita que mata a larica não só do estômago mas do espírito também. Quando o ritmo é saboroso, consomem-se mais bebidas e pratos – e o Nautk agradece claro. O tempo ajuda, talvez pelo cognome da terra ser São Pedro.
Como ou porque é que decidiste abrir uma empresa?
Quando estava a estudar nos Países Baixos para tirar a minha licenciatura, não havia muito que se passasse lá, sendo que tirei o curso numa cidade pequena (Maastricht). Quer dizer, havia festas, mas a grande maioria era de música Pop que não é propriamente a minha música de eleição. Ou seja não havia festas de house music. Então eu e um dos meus melhores amigos resolvemos criar algo, já que não havia nada lá. Havia uma falha no mercado. A nossa ideia inicial era proporcionar valor para além da festa. Queríamos doar para caridade, mas deixar que o público que vinha às nossas festas pudesse votar para quem os fundos angariados iram. Tínhamos normalmente quatro sugestões de associações para votar, criávamos um post no instagram com as diferentes opções, as pessoas podiam votar, e nós doávamos 20% do lucro à associação escolhida. Quando registámos realmente a empresa percebemos que 20% dos lucros era demasiado dado que tínhamos de pagar impostos, mas sim, foi assim que começou, numa pequena cidade na Holanda. E depois tínhamos conexões. O meu sócio é dos Estados-Unidos de San Diego. Fizemos festas lá, em Amsterdão, Roterdão, Milão e Lisboa claro porque vivo cá. Ele toma conta dos eventos na California e eu na Europa. [A empresa] foi-se expandindo naturalmente e criámos então o ‘Utopia worldwide movement’. Ainda estamos no processo de adicionar mais valor aos nossos eventos para além das doações para caridade. Mas a ideia inicial de criar mudança positiva ainda está lá.
No entanto, o que se passa durante os fins-de-semana no Nautk é completamente mérito do Tanguy. Nas palavras dele – “It’s a different thing”. A curadoria do espaço, conceitos e música são todos da sua autoria; como uma obra de arte que se estende pelo espaço.
Criaste tudo a partir do zero.
Sim inteiramente. Trato dos eventos, conceito, redes sociais, marketing e branding. Também faço a curadoria dos DJs claro dependendo do conceito. A sua praia é mais Afro House, mas procura também outras dinâmicas: Queremos criar outro conceito, que não é muito o meu gosto musical, como o Pop dos anos 80 e 90 já que temos uma audiência mais velha que frequenta o espaço também. Então devo encontrar DJs que se encaixem, que ainda não tenho.
Então encontras um DJ por…
Por evento e conceito, exactamente.
Também tratei da renovação do espaço. Costumava ser bastante diferente. Não era mau, mas algumas coisas tinham um ar kitsch, propus algumas sugestões; e aos poucos fomos mudando umas coisas aqui e ali. Adicionando decoração etc. Alterámos as cores, pintámos paredes, enfim.
Quando acontecem os eventos?
Bom, estamos a tentar revezar conceitos, porque ter sempre o mesmo evento todos os fins-de-semana perde a graça. Tentamos fazer dois eventos por semana variando o estilo musical. Ou seja, sexta e sábado às vezes domingos. Aos domingos costumamos ter música ao vivo, mais acústica (guitarra, bateria, voz); e para as sextas-feiras e sábados temos dois eventos fixos: O Solaria e o Organica. O Solaria é Afro House. E o Organica foca-se mais em Organic House ou Downtempo, tipo Tulum, chill vibes.
Date night
Sim exactamente.
Que diria que funciona com um afrodisíaco perfeito: boa música, mar, ventinho na face e uma pitada de entusiasmo pelo date em si. Fica aqui a ideia pra quem a quiser levar.
Também estamos a trabalhar noutro conceito para os domingos. Um brunch, em que o DJ começa a tocar pelas 11h, para os ouvintes virem curar a ressaca. Tomam o pequeno-almoço, ou brunch neste caso, e podem tomar uma bottomless mimosa com sumo de laranja e champanhe acompanhada por Disco House. Assim com uma música de fundo agradável no fundo. Seria mais uma daytime party. São estes os conceitos principais.
Tens uma mensagem que gostasses de deixar para quem está a começar? O que te inspirou a ingressar neste projecto?
Eu diria para te expores o máximo possível. Pôr de facto palavras em ações sabes? É completamente compreensível e normal ter medo, e pensar em como tudo pode correr mal. Mas não podes saber até tentares. Apesar do fracasso, é importante aprender e repetir. Diria, tenta só, sabes? Tentativa e erro, é esse o meu conselho.
Como encontras o teu artista interior? Dado que tens esta veia empresarial, como encontras o artista? Dirias que são entidades separadas ou és uma junção das duas?Diria que sou uma junção das duas.
Por exemplo aqui desenvolvo o todo. Crio e faço a curadoria dos eventos, que exige bastante criatividade. É preciso decidir o que colocar e onde, perceber como a iluminação funciona e perceber se resulta bem ou não. Depois também giro as redes sociais – edito imensos vídeos, por isso há muita criatividade envolvida e adoro isso! Percebi que era algo que precisava de ter no meu trabalho. E com música é igual. Quando se é DJ, é da tua responsabilidade perceber o que funciona, experimentar, ver se as transições soam bem. Também requer uma certa dose de criatividade. Por isso diria que é certamente omnipresente.
Omnipresente.
Sim.
Muito obrigada.
Obrigado por me receberem.
ENGLISH VERSION
If you could stand on the horizon line you would spot Nautk, a restaurant-bar that tends to hide in plain sight among the sea and other distractions along the Marginal. But it is truly a humble diamond in the rough. And why? The answer is simple: music. On a pleasant Friday afternoon (for those who secretly love the wind, Pochontas-style) I had the chance to enjoy a memorable sunset, perfectly tuned by a house music set played by Tanguy Delforge. Our target of the day: a multi-faceted character who brought a new life into the São Pedro bar, not only through his entrepreneurial vision but also through his palpable sense of creativity. A Belgian, who speaks fluent Brazilian Portuguese – yes they do exist – since he lived there for a few years, before landing in Portugal to study – as many do.
So I came here [to Portugal] for my studies, to do my master’s degree. But then after my master’s, I originally thought of just going back to Belgium because I already had my own events company, called Utopia. But then I met the owner of this rooftop here in São Pedro and I saw the opportunity: where he didn’t really have anybody to take care of the events, or to handle promotion, marketing and social media. So I understood that I could create a role for myself. So that’s my why, or the way I approached him and got the job.
So besides DJing, is producing events also your passion?
Yeah, for sure – that’s how it started actually. I already had my company, it’s been about two years and a half now. I didn’t really DJ before – my brother did and then he taught me how. Then with the events I was like, oh, I might as well just play at my own events, right? And that’s how it basically went.
The mix of music, snacks, and a laid-back atmosphere creates a perfect symbiosis — one that satisfies more than just the appetite, but the soul too. When the rhythm tastes just right, drinks flow and plates empty — much to Nautk’s delight, of course. The weather plays along too — must be a perk of being named after the guy who controls the skies. Thanks, Saint Peter!
How or why did you decide to start your own company?
I was studying in the Netherlands for my bachelor’s degree, in a small city called Maastricht. There wasn’t much going on there—I mean, there were parties, but most of them were pop music, which isn’t really my scene. There were no house music parties. So me and one of my best friends we were like, oh, let’s just like create it, you know, because there’s nothing there – There was a gap in the market.
We initially thought of creating value [more value than just throwing parties], we wanted to donate to charity, but let the but let the party goers vote for it. Usually, we’d have four organizations to choose from and we’d post the options on Instagram stories, people would vote, and we’d donate 20% of the profits to the charity that got the most votes. That’s how it started. When we officially registered the company, we were like okay maybe donating 20% of profits was a bit too much once taxes were factored in. But basically that’s how it started just in a little town in the Netherlands. After that, things grew naturally – We had the connections – My co-founder is from the U.S., from San Diego. We did parties there, Amsterdam, Rotterdam, Milan and Lisbon because I lived here already. He takes care of the events there I here in Europe. It soon expanded and we created the Utopia worldwide movement. We’re still working on adding more value to our events beyond charity donations, but the original goal of creating positive change is still very much alive.
That said, everything happening on weekends at Nautk is entirely thanks to Tanguy. In his own words, ‘It’s a different thing’. He curates the space, concepts, and music, like a work of art that fills the entire venue.
So you created everything from scratch?
Yes, definitely. I handle the events, the concepts, social media, marketing, and branding. I also curate the DJs, obviously, depending on the concept.
My main focus is Afro House because it’s the vibe I’m most comfortable with. But we’re also looking to create another concept, although not my personal taste. We’re trying to bring in 80s and 90s pop—because we have an older crowd who comes to the venue as well. So I still need to find DJs who fit that style; I haven’t found them yet.
So you find a DJ per…
Per event and concept. Yeah, exactly.
Yeah, I also took care actually of the renovation. This place used to be very, very different. It looked kind of… Not bad, but like a lot of things were, to me, a bit cheesy. And didn’t look good. I offered them a couple of options, and then, we changed this and this and that. Adding decoration, painted the roof white, and so on.
When do the events happen?
Well, we’re trying to rotate concepts because having the same event every weekend just loses its charm. We try to hold two events per week, switching up the music genres. So Friday or Saturday or sometimes Sunday. Like for example, Sunday we have like live music, more acoustic, you know – singing, guitar, drums. For Fridays and Saturdays, we have two regular events: Solaria and Organica. Solaria is Afro House. Organica focuses more on Organic House or Downtempo, like Tulum — lower vibes.
Date night.
Yeah, exactly.
The perfect aphrodisiac: good music, the ocean, a light breeze, and the spicy spark of excitement from the date itself. Just putting the idea out there for anyone who wants to try it out.
We’re also working on another concept for Sundays — a brunch where the DJ starts playing around 11 AM. People can come here on a Sunday, hangover, and have brunch, sip on bottomless mimosas with orange juice and champagne, to the sound of Disco House. So like, you know, easy vibe in the background, more like a daytime party. So yeah, those are the main concepts for now.’
Is there something you’d like to say to people starting out? What inspired you to begin with?
I would say just expose yourself as much as possible. Actually put things into actions, you know? It’s super understandable and normal to be afraid of how things can go wrong. But you can’t know until you do it. So even though you fail, you learn from it and you do it again. So I would say just like try, you know? Trial and error – that would be my advice.
How do you find the artists in yourself? Since you have this entrepreneurial side to your personality, how do you find the artist? Do you find that you separate them or that they come together into one?
I’d say they come together as one.
For example, here I do everything – creating and curating the events requires a lot of creativity. You need to decide where to put what, play around with lighting and figure out if it looks good or not. And the I also manage social media and content creation – I edit a lot of videos, so there’s a lot of creativity involved and I love it! I realized needed that in my work. And then with music as well, I mean, obviously when you DJ, it’s up to you to try something and if it works or not. Making a transition that sound right. It takes a bit of creativity as well. But yeah, I would say it’s definitely omnipresent.
Omnipresent.
Yeah.
Thank you so much.
Thanks for having me.